Tendo sua planta industrial inaugurada no Bairro Assunção, em 8 de dezembro de 1962 , a Scania-Vabis foi a sétima fabricante de automóveis a se instalar em São Bernardo do Campo. Ocupa até hoje o mesmo terreno adjacente à Via Anchieta, com área de 142 mil m², que corresponde ao antigo lote rural número 22 do Núcleo Colonial São Bernardo, o qual pertenceu à família Vertamatti até 1927 e, em seguida, foi comprado pelo casal Savaldor e Clotilde Bataglia. A área foi adquirida pela Vemag em 1958 e, finalmente, pela Scania, em 1961 (1).
A empresa sueca tem uma longa história, que começa com o aparecimento da VABIS, uma fabricante de vagões de trem, em dezembro de 1891, na cidade de Södertälj (2). Em 1911, A VABIS se fundiu com a Scania, fabricante de automóveis fundada na localidade de Malmö, em 1900 (3). Na década de 1950, quando procurava expandir seus negócios no exterior, a empresa passou a exportar grande parte de sua produção, da qual os caminhões estavam entre os principais itens (4).
Foi neste contexto, em 1951, que a Scania iniciou suas operações no Brasil. Inicialmente a empresa estabeleceu uma parceria com a distribuidora brasileira ELIT - Equipamentos para Lavoura Indústria e Transporte (5), a qual, em 1952, após fusão com a Distribuidora de Automóveis Studebaker, passou a se denominar VEMAG (6). O acordo envolvia a importação de caminhões que chegariam encaixotados ao porto de Santos e seriam montados nas instalações da empresa na Rua Grota Funda, no bairro Ipiranga, em São Paulo.
Em 1957, foi constituída a Scania-Vabis do Brasil, contando com 1/3 de ações pertencentes à VEMAG e o restante à fabricante sueca, com o objetivo inicial de fabricar motores (7) e deixar para a distribuidora nacional a missão de produzir o restante do veículo. Segundo o site oficial da Scania na internet, a empreitada “foi uma forma de superar as restrições às importações, as quais ameaçavam excluír a empresa daquele (...) mercado de exportações” (8). De fato, foi o alto consumo de automóveis e caminhões importados no país que levou o governo brasileiro a incentivar a instalação de multinacionais em território tupiniquim, através de uma agenda que, após proibir a compra de veículos novos montados no exterior, limitava progressivamente a importação de peças e facilitava sua fabricação local. Em 1958, foi inaugurada a fábrica de motores, na capital paulista. Em 1960, ainda contando com a Vemag para fabricação do restante do veículo (9), a Scania enfrentava dificuldades para cumprir metas de nacionalização impostas pelo governo (10), fato que foi determinante na decisão de assumir inteiramente a fabricação dos veículos, construindo para isso uma nova fabrica, a unidade de São Bernardo do Campo. Na ocasião de sua inauguração, no final de 1962, o presidente da república, João Goulart, esteve em São Bernardo, onde proferiu um discurso a favor de todo capital estrangeiro que tenha “o propósito de, irmanados conosco, construir o progresso que tanto desejamos”, aproveitando o evento para procurar sinalizar uma posição ideológica no conturbado contexto político da época (11).
As instalações de São Bernardo em 1962 constituíram a primeira fábrica completa da Scania fora da Europa. Já no ano seguinte à inauguração da nova unidade, a Scania produziu 1018 veículos no Brasil, na sua maioria caminhões pesados - principalmente os modelos L7538 e L7550 - mas também chassis para ônibus B 7578 e B7678 (12). Em 1966, os números da produção continuavam em torno dos mil veículos anuais, com a empresa fabricando 7 modelos distintos de caminhões - com destaque para o L76/11038 - e 3 tipos de chassis de ônibus. Neste mesmo o ano, a Scania empregava, em média, 1018 funcionários, os quais recebiam cerca Cr$ 356 de salário médio mensal, o que equivalia, na época, à 4,24 salários mínimos. No segundo semestre de 1971, os vencimentos mensais médios pagos pela empresa perfaziam o valor de 6,7 salários mínimos (13).
Por volta de meados da década de 1970, as instalações da fábrica em São Bernardo haviam sido significativamente ampliadas, possibilitando um grande aumento da produção e a conquista da liderança do mercado nacional de caminhões pesados nos períodos 1976-1977, 1982-1986 e 1989-1994 (14). O número de trabalhadores também aumento muito no período. Em 1978, a Scania já empregava cerca de 3000 funcionários, os quais iniciaram, neste mesmo ano, a primeira grande greve em uma década no país, o qual ainda vivia o regime político de ditadura militar. O acontecimento, que foi um dos mais importantes da história do Brasil naquele ano, ficaria conhecido como” Greve da Scania” ou “Greve Braços Cruzados- Máquinas Paradas”, sendo esta última denominação devida ao fato dos operários entraram normalmente para o expediente na fábrica, mas ficarem parados sem trabalhar pelo restante do dia. Na década de 1990, novas ampliações aconteceram, possibilitando um grande aumento na capacidade produtiva da empresa, que, desde os anos 1970, além de atender ao mercado interno, exportava veículos e peças para diversos países.
Em 2005, empregando 2229 colaboradores, a unidade de São Bernardo ainda era a segunda maior da Scania no mundo em termos de vagas de trabalho oferecidas, perdendo apenas para a matriz, em Södertälj, com 2712 funcionários. No ano anterior, com a negociação de 6093 caminhões e 576 ônibus, o Brasil havia sido, nos dois segmentos, o maior mercado da Scania no planeta (15).
Acima-> Vista aérea da planta industrial da Scania na Vila Euro, Bairro Assunção, por volta de 1970. Abaixo -> Linha de montagem de caminhões. Possivelmente meados da década de 1970. Ambas as imagens pertencem ao acervo da Scania, e foram publicadas no livro “Scania no Brasil – Passado, presente, e futuro – 1957-2007”, editado pela empresa em 2007, com autoria de Ademir Médice.
Notas:
(1) - Cf. Médice, Ademir. Scania no Brasil – Passado, presente, e futuro – 1957-2007. São Paulo: Scania Latin America Ltda, 2007. p.50
(2) - Cf. Site oficial da empresa, acessível em https://www.scania.com/.../1891-vabis-is-established.html
(3) - Cf. Site oficial da empresa, acessível em https://www.scania.com/.../1911-scania-vabis-is-created.html
(4) - Cf. Site oficial da empresa, acessível em https://www.scania.com/.../1956-more-than-50-percent-in...
(5) - Cf. Jornal Correio Paulistano. 20 de agosto de 1951. p.11.
(6) - Cf. Jornal Correio Paulistano. 20 de julho de 1952. p.3.
(7) - Cf. Médici, Ademir. Idem, p.22.
(8) - Cf. Site oficial da empresa, acessível em https://www.scania.com/.../1957-subsidiary-in-brazil.html
(9) - Cf. Jornal do Brasil, 27 de março de 1960, Cad.Automóveis.p.1.
(10) - Cf. Médici, Ademir. Idem, p.43.
(11) - Cf. Jornal do Brasil, 9 de dezembro de 1962. .p.5.
(12) - Cf. Indústria Automobilística Brasileira - ANFAVEA. Novembro/1972.São Paulo: Sindicato Nacional da Indústria de Tratores, Caminhões, Automóveis e Veículos Similares. p.42 e p.43.
(13) - Cf. Ibidem, p.124; Presidência da República. Decreto nº 57900, de 1966; Presidência da República. Decreto nº 68576, de 1971
(14) - Cf. Médici, Ademir. Idem. ps. 90,119,138 e 188.
(15) - Cf. Scania em Resumo – 2005. Folheto publicitário da empresa. P3 e p.11. Além de caminhões, ônibus e suas respectivas partes, a Scania de São Bernardo produz também motores marítimos.
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