Fonte da imagem: Freepik
Necessitamos de água. Não sobrevivemos sem ela. A maior parte do nosso corpo é composta por água.
Além de saciar nossa sede, a água é indispensável em diversas atividades: nossa higiene pessoal, na produção de alimentos, criação e cuidados de animais, na produção de roupas e outros itens industriais, na prática de esportes e lazer, na produção de energia elétrica.
Em São Bernardo do Campo encontra-se a maior parte da represa Billings, que fornece água para abastecimento público dos municípios do Grande ABC e parte de São Paulo transferindo água para a represa Guarapiranga e para o sistema do Alto Tietê. Mas você sabia que a represa não é um lago natural e foi construída para ser um reservatório para geração de energia hidroelétrica?
Na década de 1920 a cidade de São Paulo passou por um importante processo de industrialização, que levou a um aumento da população na época. Esse incremento populacional, aliado a uma forte estiagem que ocorreu nos anos de 1924 e 1925, levou a redução de cerca de 30% do fornecimento de energia elétrica.
Nesse cenário, a companhia The São Paulo Railway Light &Power, empresa fundada no Canadá que detinha a concessão do sistema de energia elétrica no Brasil desde 1899 passou a estudar novas estratégias para o abastecimento seguro de energia elétrica para a crescente demanda populacional e o processo de industrialização do Estado de São Paulo. Foi nessa época que o engenheiro Asa White Kenney Billings começou a avaliar o “Projeto da Serra”, que tinha por objetivo aproveitar o desnível da Serra do Mar para a geração de energia elétrica em Cubatão.
A Região Metropolitana de São Paulo localiza-se em área de cabeceira, com predominância de nascentes, e tem na Serra do Mar uma barreira natural para os rios, que correm em direção ao interior do Estado, e não para o litoral.
Para obter volume de água necessário à geração de energia elétrica, era preciso represar suas águas e reverter artificialmente o fluxo dos rios em direção ao litoral, aproveitando o grande desnível da Serra do Mar. Assim foi construído o Reservatório Rio das Pedras, com o represamento do Rio Grande e do Rio das Pedras. As águas do Reservatório Rio das Pedras são conduzidas por túneis até adutores que descem a Serra e chegam à Usina Henry Borden, em Cubatão, para gerar energia elétrica. Sua operação teve início em 1926.
Para aumentar a capacidade de geração de energia da Usina Henry Borden e atender a demanda crescente por energia elétrica do polo industrial próximo ao Porto de Santos, inicia-se, em 1925, a construção do Reservatório Billings. A área foi inundada em 1927, com a construção da Barragem de Pedreira, usando as águas do Rio Grande, também conhecido como Jurubatuba (um dos formadores do Rio Pinheiros), assim, as águas do Reservatório Billings são transferidas através da barragem reguladora Billings-Pedras, para alimentar a Usina (São Paulo, 2010)[1].
(Fonte da imagem: São Paulo, 2010, p.49) |
Nas décadas seguintes houve grande crescimento populacional na região do Grande ABC, o que levou ao uso das águas do Reservatório Billings para abastecimento público, iniciando-se a captação de água no braço do Rio Grande em 1958 (São Paulo, 2010).
Para aumentar a vazão da Represa e ampliar a capacidade da Usina Henry Borden, teve início na década de 1940, o desvio de parte das águas do Rio Tietê e seus afluentes para o reservatório Billings. O processo de reversão foi possível pela alteração do curso do Rio Pinheiros, por meio das Usinas Elevatórias de Pedreira e Traição. Com a reversão do Rio Pinheiros, além do aumento da produção de energia elétrica, também houve o controle das enchentes e afastamento de efluentes industriais e domésticos de São Paulo em direção à represa. Tal situação agravou a qualidade das águas do reservatório, levando a construção de uma barragem sob a Rodovia Anchieta, separando a área de captação de águas no Braço Rio Grande do Corpo Central da represa Billings (Capobianco; Whately, 2002)[2]
O processo de reversão das águas e a poluição da Billings acirraram a disputa entre os movimentos ambientalistas e representantes das indústrias do Polo Petroquímico de Cubatão, que reivindicavam aumento da produção de energia[2]. As restrições ambientais ao sistema de reversão culminaram com o estabelecido no artigo 46 das Disposições Transitórias da Constituição do Estado de São Paulo de 1989, que proíbe o bombeamento de águas poluídas para o reservatório Billings. Para regulamentar esse dispositivo legal, foi emitida, em 1992, uma Resolução Conjunta, que permite a operação de reversão apenas em situações emergenciais, entre as quais o controle das cheias do rio Pinheiros em casos de ameaças de enchente na cidade de São Paulo.
Assim, somente a implantação de um eficiente sistema de tratamento de efluentes permitirá o bombeamento de maneira contínua sem comprometimento da qualidade das águas da Billings para o abastecimento público.
Barragem Anchieta. Do lado esquerdo está a captação de água. No lado direito está o bairro do Riacho Grande. Fonte: https://1.kekantoimg.com/UnSsYq-lMrLPqZINmAv3UHKAnr8=/520x205/s3.amazonaws.com/kekanto_pics/pics/517/724517.jpg
Por ser tão especial, toda essa área de influência, a bacia hidrográfica do Reservatório Billings, tem uma lei só para protegê-la. Podemos ver o limite dessa área, navegando no mapa ao lado.
Toda a área que contribui para um rio ou lago é chamada de bacia hidrográfica.
Bacia Hidrográfica é à área de drenagem de um rio principal e de seus afluentes. É uma zona coletora de água. Corresponde à porção do espaço em que as águas das chuvas escoam em direção a um determinado curso d´água principal, lago ou lagoa, abastecendo-o.
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Em 2009 foi aprovada uma Lei Estadual para proteger especificamente a bacia hidrográfica da Billings: a Lei n° 13.579 de 2009, conhecida como Lei Específica da Billings. Esta lei determina áreas para proteção ambiental, buscando garantir a existência de vegetação que protege os rios e a represa da poluição. Nos locais em que existe vegetação, a água infiltra na terra mais lentamente, sem causar a remoção de sedimentos das camadas superficiais do solo, abastecendo assim o lençol freático e consequentemente os rios e a própria represa. São Bernardo do Campo possui ainda grande área do seu território recoberta por vegetação nativa[3], ou seja, de Mata Atlântica. A Lei Específica da Billings também prevê áreas que podem ser ocupadas mediante atendimento a critérios que garantam a proteção da represa.
Fonte Imagens: <http://www.sigrh.sp.gov.br/public/uploads/documents//CBH-RB/CT-APRM-AJ-SL/10663/apr-27052009-juquitiba.pdf> |
Assim, a legislação específica tem o objetivo de proteger a represa, criando também mecanismos próprios que regulam sua forma de ocupação: ou seja, nem todo tipo de atividade e de operação são permitidas dentro da bacia hidrográfica da Billings. Você pode navegar no mapa aqui ao lado para pesquisar as áreas que tiver interesse.
Imagine, por exemplo, se dentro dessa bacia hidrográfica fosse instalada uma indústria química com alta capacidade poluente, e seus tanques de armazenamento rompessem, lançando poluentes para os rios que compõe essa bacia? Naturalmente toda a água utilizada para abastecimento a partir da Represa Billings estaria comprometida.
E se removêssemos todas as árvores e espaços livres, ocupando-os com avenidas, prédios e grandes pátios de estacionamento de empresas? Teríamos sérios problemas de abastecimento, pois a água já não infiltraria no solo realimentando os rios e a própria represa.
Área de Proteção e Recuperação de Manancial da Represa Billings
Toda a área de mananciais da represa Billings corresponde à sua bacia hidrográfica. Isto significa que todos os rios, córregos e toda a chuva que cai nessa área irão desaguar na Billings. Se forem lançados esgotos sem tratamento, outros poluentes e lixo, esses também acabarão atingindo a represa. |
Fotos: Omar Matsumoto, Gabriel Inamine, Luciana Nascimento e Nilson Sandré, PMSBC, 2019
Para evitar que isso aconteça de modo a gerar impactos irreversíveis para a manutenção do abastecimento e da geração de energia, a Billings segue um zoneamento especial, e o licenciamento para instalação dessas atividades possui rigoroso processo de análise, tanto na Prefeitura como no Governo do Estado. Além disso, existe uma fiscalização especial para estas áreas, contribuindo para o controle dessa ocupação na restrição de irregularidades de uso. O licenciamento também é um mecanismo que regula o uso da terra na região, além das atividades instaladas, buscando garantir a conservação dos recursos naturais e a qualidade da água.
A água tem diversas características que podem tornar seu uso próprio ou impróprio. Ela pode ter qualidade para atividades como natação ou banho (balneabilidade), mas pode não ter qualidade para ser bebida diretamente (potabilidade).
A qualidade da água é avaliada por meio do monitoramento de diferentes parâmetros sejam físicos, químicos ou biológicos:
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Físicos: cor, sabor, transparência/turbidez
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Químicos: pH, fósforo, nitrogênio, oxigênio dissolvido, substâncias
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Biológicos: organismos (ex.: bactérias – coliformes)
Existem índices que agregam vários parâmetros e permitem uma avaliação da qualidade da água. Nas águas superficiais, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) realiza o monitoramento. Um desses índices é o IQA - Índice de Qualidade das Águas, composto por nove (9) parâmetros entre físicos, químicos e biológicos.
Para o cálculo do IQA, são consideradas variáveis de qualidade que indicam o lançamento de efluentes sanitários para o corpo d’água, fornecendo uma visão geral sobre as condições de qualidade das águas superficiais. (CETESB, Qualidade das Águas Interiores no Estado de São Paulo, 2019, P.22). O IQA possui uma classificação que varia de 0 a 100.
Para o ano de 2022, os pontos de monitoramento em São Bernardo apresentaram os seguintes IQA (Fonte: <http://datageo.ambiente.sp.gov.br/app/?ctx=DATAGEO#>):
Um dos principais fatores de degradação da qualidade da água é o lançamento de esgotos sem tratamento.
Toda vez que fazemos nossa higiene pessoal consumindo água, estamos gerando esgoto na mesma quantidade.
Em São Bernardo do Campo (2022), foram consumidos 163,59 litros de água por habitante por dia. Isso é mais do que o consumo médio no país: 148,19 litros por habitante/dia. E maior do que o consumo necessário recomendado pela ONU: 110 litros/dia.
Se esse esgoto for lançado sem tratamento, irá poluir os rios. E se estiver na área da bacia hidrográfica da Billings, vai poluir a represa que nos abastece. Tanto os efluentes domésticos como os industriais são fontes de poluição se não tratados.
Os dados oficiais de monitoramento do saneamento são divulgados pelo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento – SNIS.
De acordo com dados do SNIS, em São Bernardo do Campo, ano base 2022, temos:
Índice de coleta de esgoto | Índice de tratamento de esgoto |
% | % |
91,86 | 42,93 |
fonte: MDR - Ministério do Desenvolvimento Regional (Indicadores da coleta (mdr.gov.br)) - acessado em 20/05/2024
O tipo de esgotamento sanitário do município é por rede geral e também por rede pluvial onde o esgoto corre juntamente com a água da chuva.
Fonte: Dados sobre esgotamento sanitário SBC – IBGE (2010)[4]
São Bernardo do Campo está dentro da Região Metropolitana de São Paulo, uma das regiões com maior dinâmica econômica e contingente populacional e, também, com maior pressão sobre os recursos naturais, principalmente sobre a água.
Lembra do conceito de bacia hidrográfica que discutimos acima? Esse conceito é muito importante quando queremos proteger os recursos hídricos, tão essenciais à nossa sobrevivência. Por isso o Estado de São Paulo está subdividido em diversas Unidades de Gerenciamento de Recursos Hídricos – UGRHI, que visam proteger as diferentes bacias hidrográficas.
A Região Metropolitana de São Paulo está majoritariamente contida na bacia hidrográfica do Alto Tietê – UGRHI 6. Essa é uma bacia em situação crítica de disponibilidade hídrica. Isso quer dizer que o risco de falta de água nessa região é muito elevado, conforme a figura.
Assista ao vídeo:
O abastecimento de água em São Bernardo é fornecido em maior parte pela rede geral. Uma pequena proporção é abastecida por poço, nascente, carro-pipa e outros.
Dados CENSO IBGE 2010[5]
Conforme estabelece a Politica Nacional de Recursos Hídricos, cada bacia hidrográfica possui um comitê, que é um órgão colegiado, composto por representantes do Estado, Municípios e Sociedade civil. Os comitês de bacia visam discutir e decidir sobre assuntos que envolvem os usos dos recursos hídricos e sua proteção.
São Bernardo do Campo está no subcomitê Billings-Tamanduateí, que pertence ao Comitê da Bacia Hidrográfica da Bacia do Alto Tietê.
Fonte: <www.sigrh.sp.gov.br/cbhat/apresentacao>
O que você pode fazer
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REFERÊNCIAS
CAPOBIANCO, João Paulo Ribeiro;WHATELY, Marussia. Billings 2000 - Ameaças e perspectivas para o maior reservatório de água da Região Metropolitana de São Paulo.São Paulo: Instituto Socioambiental - ISA, 2002. Acesso em 04 mar. 2020
COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SÃO PAULO (CETESB). Qualidade das águas interiores no estado de São Paulo 2018. São Paulo: CETESB, 2019. Disponível em: <https://cetesb.sp.gov.br/aguas-interiores/publicacoes-e-relatorios> Acesso em 04 mar. 2020
DATAGEO - Infraestrutura de dados espaciais ambientais do Estado de São Paulo. Disponível em: <http://datageo.ambiente.sp.gov.br> Acesso em 04 mar. 2020
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Censo demográfico 2010- Sistema SIDRA de Banco de dados. < https://sidra.ibge.gov.br/> Acesso em 04 mar. 2020
PREFEITURA DE SÃO BERNARDO DO CAMPO. Relatório de Qualidade Ambiental do Município de São Bernardo do Campo. Disponível em: <https://www.saobernardo.sp.gov.br/web/sma/simiqua/relatorios-e-planos> Acesso em 04 mar. 2020
SÃO PAULO (ESTADO). Secretaria do Meio Ambiente / Coordenadoria de Educação Ambiental. Billings. (Cadernos de Educação Ambiental – Edição Especial Mananciais, vol. I). - - São Paulo : SMA/CEA, 2010. 150p. Disponível em: < http://arquivos.ambiente.sp.gov.br/publicacoes/2016/12/mananciais-billings-edicao-especial-2011.pdf > Acesso em 04 mar. 2020
SISTEMA NACIONAL DE INFORMAÇÕES SOBRE SANEAMENTO (SNIS). < http://www.snis.gov.br/> Acesso em 04 mar. 2020
NOTAS
[1] São Paulo (Estado) . Secretaria do Meio Ambiente / Coordenadoria de Educação Ambiental. Billings. - - São Paulo : SMA/CEA, 2010. 150p. ; 21x29,7cm. (Cadernos de Educação Ambiental – Edição Especial Mananciais, vol. I). Disponível em: < http://arquivos.ambiente.sp.gov.br/publicacoes/2016/12/mananciais-billings-edicao-especial-2011.pdf > Acesso em 04 mar. 2020
[2] Capobianco, João Paulo Ribeiro; Whately, Marussia. BILLINGS 2000 - Ameaças e perspectivas para o maior reservatório de água da Região Metropolitana de São Paulo. São Paulo: Instituto Socioambiental - ISA, 2002. Acesso em 04 mar. 2020
[3] Dados de mapeamentos da PMSBC/SMA de 2011 indicaram que 82,68% da área Município correspondem a áreas permeáveis. Relatório de Qualidade Ambiental do Município de São Bernardo do Campo. Disponível em: <https://www.saobernardo.sp.gov.br/web/sma/simiqua/relatorios-e-planos> Acesso em 04 mar. 2020
[4] https://sidra.ibge.gov.br/tabela/1394 Acesso em 04 mar. 2020
[5] https://sidra.ibge.gov.br/tabela/3263 Acesso em 04 mar. 2020
Atualizado em dezembro/2020