“Eu sou essa gente que se dói inteira porque não vive só na superfície das coisas.”
(Rachel de Queiroz)
O livro escolhido para leitura no clube de leitores da cidade é o romance “O quinze” da escritora Rachel de Queiroz.
Romance de estreia desta autora cearense, lançado no ano de 1930, quando Rachel de Queiroz não havia completado vinte anos de idade, tem como tema central a história vivida por personagens que vocalizam as tragédias humanas durante a grande seca de 1915 que assolou o sertão nordestino.
“Chegou a desolação da primeira fome. Vinha seca e trágica, surgindo no fundo sujo dos sacos vazios, na descarnada nudez das latas raspadas”.
Obra que ocupa um lugar na chamada segunda geração modernista (1930-45),que se definiu pela produção de uma prosa regionalista, um romance com uma perspectiva realista do mundo contemporâneo e suas contradições, valorizando o espaço e o meio regional na produção e reprodução social de desigualdades e dramas humanos.
Rachel de Queiroz com uma escrita precisa e concisa, porém sensível e poética narra em suas linhas tão bem escritas as agruras e os dramas humanos e sociais de uma região tão castigada pelas desigualdade, onde afloram a oralidade popular e as vozes do homem e da mulher comum, com suas tradições, religiosidades, resistências e resignações.
Como uma grande contadora de histórias, a autora nos apresenta a história de Vicente, Conceição e a saga dramática do vaqueiro Chico Bento e sua família, que vivenciam a grande seca de 1915, de lugares distintos socialmente, típicos de uma região marcada pelas desigualdades raciais e de classe.
“Agora, ao Chico Bento, como único recurso, só restava arribar. Sem legume, sem serviço, sem meios de nenhuma espécie, não havia de ficar morrendo de fome, enquanto a seca durasse. Depois, o mundo é grande e no Amazonas sempre há borracha”
O vaqueiro Chico Bento, sua mulher e filhos representam a síntese do retirante, obrigados a abandonar sua terra por condições de miséria e fome, para tentar encontrar refúgio numa grande cidade, entretanto a longa marcha desta família narrada no romance é saturada por privações, tragédias e desumanização.
"Lá se tinha ficado o Josias, na sua cova à beira da estrada, com uma cruz de dois paus amarrados, feita pelo pai. Ficou em paz. Não tinha mais que chorar de fome, estrada afora. Não tinha mais alguns anos de miséria à frente da vida, para cair depois no mesmo buraco, à sombra das mesma cruz."
A personagem Conceição divide-se nos cuidados de sua avô Inácia, na ajuda aos flagelados da seca no campo de concentração e no amor velado ao seu primo Vicente, este mesmo que não abandona suas terras e seu gado durante o período da grande estiagem, e vê ver sucubirsucumbir muitos de seus animais e a partida de tantos homens e mulheres na condição de retirantes.
O Quinze é um clássico da prosa regionalista e da literatura brasileira, até hoje nos coloca diante de questões históricas e das feridas abertas de um país marcado por todo o tipo de desigualdades e mazelas sociais. Dramas sociais e humanos que se perenizam na longa duração histórica reproduzindo relações de poder e opressão de classe.
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