As origens das escolas técnicas públicas brasileiras remontam ao ano de 1909, quando um decreto do presidente Nilo Peçanha determinou a criação de escolas de aprendizes artífices nas capitais estaduais (1) . Em conseqüência, surgiu em 1910 a Escola de Aprendizes Artífices de São Paulo, a qual, ao contrário de suas similares, que mantinham cursos dedicados às indústrias artesanais tradicionais, acabaria por concentrar esforços no ensino das técnicas mais comuns na indústria moderna, como a tornearia, a mecânica e a elétrica (2). Em 1937, estas escolas passaram a se denominar “Liceus Industriais” (3). A chamada lei orgânica do ensino industrial, promulgada em 1942 (4), no âmbito das reformas educacionais promovidas pelo ministro Gustavo Capanema, transformou estes liceus e outras escolas profissionais em Escolas Industriais, destinadas ao primeiro ciclo do ensino secundário – nível equivalente ao atual ensino fundamental II – ou, quando reuniam os requisitos necessários, em Escolas Técnicas Industriais, orientadas para o segundo ciclo do secundário – grau análogo ao ensino médio da atualidade.

Abrangendo um período de pouco mais de 30 anos, esta seqüência de leis representou esforços do governo federal que visavam a difusão e padronização do ensino profissional no país, com o intuito de fornecer uma mão de obra mais abundante e especializada para a crescente indústria nacional. Originalmente, o público alvo das escolas técnicas e industriais se encontrava nas camadas pobres ou médias da população, de modo que estas escolas não davam acesso ao graus subseqüentes no ensino acadêmico (5), que normalmente eram cursados pelos mais abastados, que buscavam seguir carreiras de maior prestígio social ligadas ao direito ou à medicina.

A lei que criou a Escola Técnica em São Bernardo do Campo é de 1957. Oficializava um convênio firmado no ano anterior – pelo qual o município forneceria o terreno para as instalações, o governo federal arcaria com os custos de construção e equipamento, e o governo estadual financiaria o funcionamento da instituição, incluindo o pagamento dos funcionários. O local escolhido para a construção da escola foi a Chácara de Enéas Queiroz Ferreira, na Avenida Pereira Barreto – Bairro Baeta Neves, cujo início do processo de desapropriação remontava à primeira gestão de Lauro Gomes no executivo de São Bernardo do Campo, ainda que a conclusão do negócio, com o devido pagamento do proprietário, tenha ocorrido na administração Pinotti (1956-1959) ( 6 ). Durante este ano e os seguintes, a imprensa paulistana divulgou diversas vezes encontros do deputado federal – depois prefeito reeleito - Lauro Gomes com autoridades federais e estaduais , para conversas sobre a construção da escola ( 7 ), fato que contribuiu para que o nome do político tenha sido escolhido para denominar oficialmente a instituição a partir de outubro de 1966, quando o mesmo já havia falecido e Hygino de Lima, seu aliado, era prefeito.

Os recursos não chegaram na velocidade necessária e as obras sofreram vários atrasos, e, a rigor, nunca foram totalmente concluídas, uma vez que diversas instalações projetadas não foram construídas e uma delas – o bloco 1 - permaneceu por décadas como uma estrutura inacabada.

Em 1965, quando a escola foi inaugurada, o Brasil possuía outras 23 escolas técnicas em funcionamento e outras 4 com previsão de inauguração em datas próximas. Uma das características especiais da unidade de São Bernardo era o fato de ser administrada por um conselho com alto grau de autonomia ( 8 ), formado por membros das três esferas governamentais que firmaram o acordo tripartite originário da escola, além de membros da APM e do corpo docente. Em 1968, mesmo quando a grande maioria das escolas técnicas do estado foi absorvida pelo recém-criado Centro Paula Souza, a unidade de São Bernardo permaneceu independente, recebendo subsídios federais e estaduais, e mantendo controle sobre contratação de professores, salários, cargas horárias, e mesmo, em certa medida, sobre o planejamento didático dos cursos ( 9 ) Em 1971, graças à ligação da escola com a União, a ETI recebeu 530 mil cruzeiros em equipamentos doados pelo governo da Alemanha Ocidental, que então mantinha um acordo de cooperação técnica com o Brasil (10).

A aula inaugural, dada a 8 de março de 1965, teve a presença de apenas de 74 alunos, matriculados no curso de máquinas e motores. Dez anos depois a escola já possuía 2275 alunos distribuídos nos cursos de mecânica, eletrotécnica e eletrônica (11) .

Em janeiro de 1981 (12), devido à não renovação do convênio tripartite, a ETI Lauro Gomes finalmente passou ao controle do Centro Paula Souza, trocando a palavra “Industrial” por “Estadual” na sua denominação algum tempo depois. A mudança despertou temores e protestos por parte da APM, dos professores e do diretor Élzio D’Arienzo. O prefeito de São Bernardo do Campo, Tito Costa, chegou a entrar na justiça contra a mudança. Acreditava-se que o novo arranjo institucional provocaria e a diminuição das verbas destinadas à escola e também no salário dos professores, levando a uma queda no nível do ensino. Entre 1985 e 1986, pleiteou-se um novo convênio, com a APM substituindo a União, para a recuperação da autonomia da escola, com o argumento que os temores de queda no nível de ensino haviam se concretizado( 13).

Ainda nos anos 80 novos cursos técnicos foram criados, como os de Desenho de Projetos de Mecânica. Laboratorista Industrial - que representam uma evolução de cursos mais básicos e que não conferiam diplomas de técnico, existentes na escola desde 1971-, e de Processamento de Dados (14). Este último foi pioneiro na esfera das escolas estaduais, e se tornou rapidamente o mais procurado da instituição, apresentando uma proporção de 9 candidatos por vaga no vestibulinho de 1988 (15).Em 1998, uma reforma do ensino técnico industrial introduziu cursos técnicos avulsos e o ensino médio exclusivo na instituição (16). A partir deste momento, e também pelas décadas seguintes, diversas novas especialidades técnicas foram introduzidas como opções de ensino na escola: mecatrônica, automação industrial, logística, administração, etc. Desde a década de 2000, a participação dos alunos da escola no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) tem sido um destaque na região, especialmente entre as instituições públicas (17). O mesmo ocorreu com várias outras escolas técnicas do estado, e provavelmente se relaciona com o fato de existir uma concorrência significativa para o ingresso nas mesmas, promovendo uma seleção prévia de alunos com melhores condições de apresentar bom desempenho escolar, as quais se refletem no momento de realização das provas do ENEM. (18) (19).

 

 

Maquete com o projeto original da atual ETEC Lauro Gomes. Década de 1960. Diversas instalações idealizadas não foram de fato construídas, como alojamentos para alunos e professores, e, também, diversas edificações com funções esportivas e culturais.

 

 

Notas:
(1) - Cf. Decreto nº 7566, de 23 de setembro de 1909. O texto do decreto trazia uma justificativa social: “O Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil (...), considerando: que o aumento constante da população das cidades exige que se facilite às classes proletárias os meios de vencer as dificuldades sempre crescentes da luta pela existência; que para isso se torna necessário, não só habilitar os filhos dos desfavorecidos da fortuna com o indispensável preparo técnico e intelectual, como fazê-los adquirir hábitos de trabalho profícuo, que os afastará da ociosidade ignorante, escola do vício e do crime; (...) decreta: (...) ”.
(2) - Cf. Bontempi Jr., Bruno. Do vazio à forma escolar moderna: a história da educação como um fardo na cidade de São Paulo. In: PORTA, Paula. História da cidade de São Paulo: a cidade no Império (1823-1889). São Paulo: Paz e Terra, 2004. p. 547.
(3) - Cf. Lei n° 378, de 13 de janeiro de 1937. Artigo 37.
(4) - Cf. Decreto-lei n° 4073, de 30 de janeiro de 1942.
(5) – Cf. Segundo a lei orgânica de 1942, o ingresso dos alunos que concluíam o curso técnico no ensino superior era assegurado apenas“ em curso diretamente relacionado com o curso técnico concluído, verificada a satisfação das condições de preparo, determinadas pela legislação competente”. Cf. Decreto-lei n° 4073, de 30 de janeiro de 1942, Capítulo IV, artigo 18, parágrafo III.
(6) - Cf. Laranjeira, Carlos. A vida de Lauro Gomes. São Bernardo do Campo, 2004. p. 74 e 75.
(7) - Cf. Jornal Correio Paulistano, 8/1/57 Cad.1 p.2; 27/2/57 Cad.1 p.2; 2/4/57 Cad.1 p.2; 19/7/57 Cad.1 p.2; 25/3/62 Cad.1 p.2.
(8) - Cf. Jornal Diário Popular, 14/12, 1980. p. 21.
(9) - Cf. Jornal Diário do Grande ABC, 30/6/85. cad c.
(10) - Em um primeiro lote, chegaram à São Bernardo máquinas de extrusão e termoplásticos, prensa de repuxamento, além de equipamento para laboratórios de eletrônica e eletrotécnica. Cf. O Estado de São Paulo, 10/12/1971 p. 14.
(11) - Cf. Folha de São Bernardo, 20/8/1975, p.20 .
(12) - Cf. Decreto Estadual 16309, de 4/12/1980.
(13) - Cf. O Estado de São Paulo, 12/1/86, p. 28 ; Jornal Diário do Grande 30/6/85. cad c.
(14) - Cf. http://www.etelg.com.br/paginaete/escola/historico.htm
(15) - Cf. Diário do Grande ABC, 20/10/89, p. 6. cad a.
(16) - Cf. Diário do Grande ABC, 14/10/99, p. 3. cad. Sete Cidades.
(17) - Cf. Em 2008, a ETEC Lauro Gomes foi a melhor colocada do ENEM na região do ABC, superando até mesmo as escolas particulares. Cf . jornal “ O Estado de São Paulo”, 29/4/2009, p.74.
(18) - Cf. Diário do Grande ABC, 9/02/2007, p.9. cad. Sete Cidades.
(19) - Em 2009, ETE Lauro Gomes recebeu sua denominação atual, passou a ser denominada ETEC Lauro Gomes

 

 

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