Durante o século XIX, a área por onde hoje se estende a Rua Américo Brasiliense pertenceu, inicialmente, às terras de Manoel Rodrigues de Barros, depois, às de Francisco Martins Bonilha, e, finalmente, em 1876 foi adquirida pelo governo imperial brasileiro para instalação da sede urbana do Núcleo Colonial S. Bernardo. É possível que parte do traçado da rua já existisse desde a época de Francisco Martins, como integrante de uma estrada vicinal que deveria incluir também a atual Rua Tiradentes e chegar até à região da montanha conhecida como Pico do Bonilha. Entre o Rio dos Couros e o local onde hoje está a Rua São Bento, a administração do núcleo dividiu as margens da antiga estrada em 35 terrenos. Os lotes urbanos então planejados eram grandes. A maioria tinha cerca de 33 metros de frente por 72 metros de fundos. Os cruzamentos com as hodiernas ruas João Pessoa, Bela Vista e Marechal Deodoro já existiam todos por volta do ano de 1902 (1). Em 1894, surgiu a atual denominação da rua (2), que se refere ao político do Partido Republicano que governou o Estado de São Paulo na maior parte do ano de 1891. A escolha provavelmente se deve à forte ligação de José Luiz Fláquer - então o político mais influente de São Bernardo e cujo irmão era Intendente - com o Partido Republicano, e em especial com a facção deodorista, à qual pertencia também Américo (3).

Em 1897, um recenseamento do núcleo detalhava as famílias residentes na área (4). Ocupando 3 lotes, em uma vasta área, que compreende desde o terreno em que, em 2011, foi construído o Edifício do Condomínio Portal Magistrale (nº 575), até o condomínio Riviera (nº 627), edificado na década de 1980, viviam sete membros da família Delegá, incluindo o patriarca Giuseppe, e os filhos Abrão e André; Um pouco abaixo, onde, também por volta de 2011, foi construído o edifício Castello di Roma (nº 515) residiam Antonio e Maria Genari junto aos dois filhos; no mesmo trecho, mas do outro lado da rua, na esquina onde na década de 2000 foi construído o prédio da FASB, residia o casal Ana e Antonio Procop, junto de seu filho. A casa construída por estes alemães foi adquirida pela família Lima na década de 1930, tendo sido residência do prefeito Hygino de Lima até os anos 1990. Foi demolida por volta de 2004; seguindo acima por este mesmo lado da rua o censo registrava a residência da Viúva Cristiana Prügner, que morava junto com os filhos - Clara, Emílio e Renato.

No quarteirão localizado entre a Rua Marechal Deodoro e a Rua João Pessoa, residiam, segundo o mesmo documento, do lado de numeração ímpar, no sentido da subida da rua: Jacob Rochetti e família; a viúva alemã Maria Haesel - junto à sua filha e outras meninas da mesma parentela- cuja casa (nº 352) existiu até abril de 1984 (5); Benvenuta Setti e seu filho Adelelmo; o casal alemão Jacob e Ana Mainel; e o italiano Luiz Cerchiari , na esquina onde hoje funciona um posto de gasolina. No lado par, onde, desde a década de 70 existe uma mansão com muros avermelhados, situava-se a residência de Ítalo Stefanini e sua esposa Carlota, cujo terreno abrigava uma das primeiras indústrias da cidade, uma fábrica de Charutos que funcionou entre 1895 e 1905. Na sua parte mais baixa, a rua terminava no Rio dos Couros ( Av. Faria Lima), em cujas adjacências residia o funileiro Luigi Mania, junto à sua esposa e seus filhos.

Ainda segundo o censo de 1897, o último quarteirão, localizado na parte mais alta da rua, trazia grandes terrenos pertencentes às famílias Coppini – lado ímpar - e Borali – lado par, ambas com muitos membros residentes no local. Por fim, nesta mesma quadra viviam ainda os Rochetti, do lado par, na altura do atual nº 764, e, do lado ímpar, aproximadamente no início da Rua São Bento, existia a casa de Giuseppe Gerbelli, que ali morava com sete outros familiares.

Em uma planta datada de 1902 (6) , é possível observar o registro da construção de outras casas: no lote nº 29, pertencente a Leonardo Washmund, na área onde está o Instituto de Fraturas, Ortopedia e Reabilitação (IFOR); nos lotes nº 27 – de Gustavo Rathsam, e nº 31 – de Adelaide Zaparolli, neste mesmo quarteirão; no lote nº 4 – de Miguel Sodrezesky, vizinho de Stefanini. Uma característica notável desta primeira fase da história da Rua Américo Brasiliense é que suas margens concentravam, acentuadamente, o maior número de propriedades pertencentes a famílias alemãs em toda sede urbana do núcleo colonial – eram 7 proprietários alemães ,13 italianos, 2 brasileiros e 1 polonês - sendo possível que isso se deva à uma política deliberada da parte de seus administradores .

Depois de 3 décadas de relativa estagnação, o grau de ocupação da rua começou a aumentar. Em meados da década de 30, nela registravam-se cerca de 35 prédios sujeitos aos impostos (7). Em 1958, acompanhando o explosivo crescimento demográfico do município como um todo, a Américo Brasiliense já abrigava por volta de 85 imóveis (8). Neste ano aconteceu o reemplacamento de todos os prédios da rua, os quais ganharam então a numeração que, em grande parte, permanece até os dias de hoje. Na época, a rua atravessava o Rio dos Couros através de uma ponte e se estendia até a Rua Jurubatuba, com vários imóveis nesta área, entre eles o prédio da Delegacia de Polícia, localizado onde, em 2020, foi inaugurada a Praça-Parque Américo Brasiliense. No outro extremo da via, a Rua São Bento já existia e estava densamente ocupada.

Ainda em relação ao fim da década de 1950, é interessante observar a presença da indústria moveleira no local. No antigo terreno da família Delega estavam localizadas as extensas instalações da fábrica de móveis “Viúva João Russo & Irmãos”. Na esquina com a Bela Vista, no antigo lote da família Boralli localizava-se a grande fábrica dos irmãos Gerbelli. Na parte baixa da via, quase na esquina com a Rua Jurubatuba, estava a pequena indústria de Joaquim de Melo (9). À exceção destes grandes terrenos ocupados por indústrias, quase todos os imóveis da rua eram residências - a grande maioria ocupada por seu proprietário. Alguns elementos do início do século XX ainda se faziam notar, como os grandes quintais e algumas casas remanescentes.

Na década de 1960, foi construído, na esquina com a Rua João Pessoa, o edifício atual do Colégio Leonor Mendes de Barros, e, na década de 1970, o prédio do IFOR. Estes últimos marcam o início da ocupação de uma boa parte do espaço pelo setor de serviços – em especial nas áreas de saúde e educação - o qual avançou a partir das décadas de 1990 e 2000. Nas últimas décadas, surgiram também vários estacionamentos, além de alguns estabelecimentos comerciais. A função residencial da Rua Américo Brasiliense continua a existir até os dias de hoje, sobretudo nos condomínios construídos desde a década de 1980.

 


Esquerda: Vista aérea do trecho inicial da Rua Américo Brasiliense. 1976. Direita: A casa de Maria Haesel, construída no século XIX,

pouco antes de sua demolição, em abril de 1984.
 

 


Notas:
(1) - Delphy, Eng. Luiz. Planta Cadastral da Vila de São Bernardo. 1902.
(2) - Cf. Câmara Municipal de São Bernardo. Procuradoria. Impostos diversos (1893-1899).
(3) - Cf. Jacobine, Jorge H. Scopel. José Luiz Fláquer. PMSBC - Portal da Secretaria de Cultura e Juventude. 2022. Acessível em https://www.saobernardo.sp.gov.br/.../jose-luiz-flaquer
(4) - Cf. Livro de Matrícula dos Colonos – Núcleo Colonial de São Bernardo/Sede. Inspetoria Geral de Terras, Colonização, Imigração do Estado de São Paulo. (1877/1892). Acervo: Arquivo do Estado de São Paulo
(5) - Cf. Medice, Ademir. São Bernardo, Seus Bairros, Sua Gente. São Bernardo do Campo, PMSBC, 1984 (2ª Edição). p.19.
(6) - Cf. Delphy, Eng. Luiz.Idem.
(7) - Imp. 1935.
(8) - PMSBC. Processo Administrativo 3052/1958.
(9 ) - Um outro grande galpão industrial que existiu na rua foi aquele pertencente à Algodoeira Lantieri, construído entre os anos 1960 e 1970.

 

 

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