José Luiz Fláquer foi o político mais influente de São Bernardo  durante as primeiras três décadas de República Velha. Nascido em Itu, em 1854, era filho de espanhóis que se dedicaram ao comércio e à agricultura. Em 1873, aos 19 anos de idade,  acompanhou em sua  cidade natal a histórica convenção que deu origem ao Partido Republicano Paulista, ao qual esteve ligado a maior parte de sua vida. Neste  ano já residia na Rua São Bento, em São Paulo, e desde o ano  de 1872 já existem registros de passagens  suas na Faculdade de Direito de São Paulo, para prestar exames de francês  (1).

Entre 1875 e 1876,  freqüentou a Escola Normal de São Paulo, formando-se professor.  Entre seus colegas de turma estão Joaquim Lopes da Silva, futuro editor do semanário são-bernardense “O Progresso” ,  e Lindolfo de Paula, que se tornaria vereador em São Bernardo  em 1892 (2).  Desde  1877, passa a atuar como professor na estação ferroviária do Rio Grande, na Freguesia de São Bernardo.   Na capital, neste mesmo ano,  freqüentou , junto ao líder abolicionista Luiz Gama e ao futuro governador de São Paulo,  Américo Brasiliense,   a Loja Maçônica América, um dos principais espaços  ligados à militância republicana e abolicionista (3).  Ainda em relação ao abolicionismo, existem memórias  – provavelmente com origem familiar e de comprovação muito difícil  –  de que Fláquer recebia escravos fugidos em sua casa em São Bernardo e os remetia para um quilombo em Santos. Segundo estas memórias, também  teria conseguido  a libertação de todos os  escravos de seu pai ainda em 1872 (4). 

Em 1878, enquanto professor, Fláquer cuidou de doentes vitimados pela epidemia de febre tifóide que assolou a Freguesia de São Bernardo. O episódio lhe trouxe notoriedade na imprensa e reconhecimento por parte do poder público (5). Apesar disso, sua formação em medicina é uma questão incerta . Os poucos textos biográficos existentes (6)  são contraditórios entre si e em relação às fontes primárias disponíveis, as quais não indicam que esta formação tenha de fato se completado, ao menos  em cursos oficiais.  Essa circunstância foi explorada,  já em 1898,  pelo adversário político de Fláquer, Saladino Cardoso Franco, o qual, em nota a um grande jornal paulista, afirmou que seu nome não constava na  lista oficial de médicos registrados, questionando sua qualificação profissional (7). Formado ou não, é certo  que a partir 1882,  Fláquer passou a se declarar  médico, tendo sido reconhecido como tal,  e tendo,  de fato,  exercido a prática muitas vezes no município de São Bernardo,  atendendo a chamados da parteira Teresina Fantinatti, assinando atestados de óbito, atendendo pacientes em outras epidemias, incluindo a gripe espanhola de 1919, já no final da vida.

O primeiro sucesso da carreira política veio em  2 de julho  de  1880, quando  se elegeu Juiz de Paz na Freguesia de  São Bernardo, pelo Partido Republicano Paulista. Após a  Proclamação da República, tentou se eleger deputado federal constituinte em 1890, mas não obteve sucesso. Em 1891,   conseguiu se eleger para a Assembléia Constituinte Estadual, obtendo 27575  votos e  cumprido o mandato  até a dissolução da legislatura, no início do ano posterior.    Em  abril de 1892.  foi acusado de estar entre os chefes de uma conspiração para derrubar o presidente do estado em exercício -  Cerqueira César -   e anular a recente dissolução da Assembléia Legislativa,  reempossando os deputados  constituintes ao invés dos eleitos na eleição de 7 março  de 1892. Segundo a acusação, Fláquer teria  contribuído para a conspiração recrutando 300 capangas para integrar a força armada dos insurretos. Sabe-se que pelo menos dois dos ex-deputados conspiradores chegaram a ser presos  e Fláquer foi demitido a bem do serviço público do cargo de sub-delegado que passara a ocupar em São Bernardo. Em maio do mesmo ano, todos foram anistiados (8).  Alguns anos depois   seria eleito duas vezes  deputado federal, permanecendo no cargo  entre 1896 e 1899.  Posteriormente  voltou ao legislativo  estadual,  elegendo-se deputado  em 1904, 1907 e 1910 e senador estadual em 1910 e 1919. 

Chefe local do partido republicano desde 1880, José Luiz Fláquer foi um dos  líderes do movimento pela emancipação, criação  e instalação do  município de São Bernardo em 1889 e 1890.   Embora tenha ocupado diretamente alguns cargos importantes – Subdelegado Juiz de Paz   e Vereador  - foi através de seus irmãos mais jovens que ele  se ligou de forma mais regular à política local.  Em 1886,  já se registra a presença do pai, Luiz Pinto Fláquer, e dos irmãos -  Luiz Pinto Flaquer Jr. e Alfredo Fláquer -  na região, estabelecidos com armazém de secos e molhados. Fláquer Jr foi  prefeito (Intendente)  municipal entre 1892 e 1896  e faleceu ainda jovem, em 1897. Alfredo foi vereador e prefeito diversas vezes entre 1896  e 1914. Foi em 1894,  na  gestão de Fláquer Jr. que as seis primeiras ruas do atual centro de São Bernardo do Campo e de toda a região do ABC,  receberam suas denominações. Duas delas  homenageavam  políticos que não apenas eram republicanos,  mas que também gozaram do apoio da facção partidária de José Luiz, em especial durante a crise  desencadeada  pelo  golpe  de 3 de novembro de 1891,  à qual se ligaria  a conjuração  de que  Fláquer foi acusado em  abril de 1892: Marechal Deodoro e  Américo Brasiliense. Uma terceira homenageava o ativista  abolicionista e também republicano,  Antônio  Silva Jardim, falecido em circunstâncias trágicas em  1 de julho de 1891.   Por fim,  uma quarta rua recebeu a denominação “ Dr. Fláquer”,  homenageando ainda em vida o  próprio José Luiz e lhe perpetuando o título de doutor, questionado por Saladino (9).

 

              Fotografia de José Luiz Fláquer publicada em 1937, no Álbum de São Bernardo, de autoria de José Netto Caldeira.  

             

Notas

(1) – Cf. Jornal Correio Paulistano.  22/11/1872. p.2  e  21/10/1873, p.3 ; .Jornal Diário de  São Paulo.  23/10/1873 p.3.

(2) – Cf. Jornal Correio Paulistano. 19/12/1875. p.2 ;  .Jornal Diário de  São Paulo.  15/12/1876, p.3.  e  19/12/1876 p.2.

(3) - Cf. Boletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil : Jornal Offical da Maçonaria Brazileira (RJ) - 1873 a 1877.  p.477.

(4 )  –Cf. Orsi. Itamir Lello. Famílias Ilustres e Tradicionais de Santo André. Vol II. Santo André: L.P. Promoções e Publicidade. 1995. P.59 

(5) – Cf. Jornal Diário de São Paulo. 18/03/1878. p.1  e 27/03/1878. p2. ; Jornal A Província de São Paulo. 8/03/1878 e p.2; 3/5/1878. P.1.

(6) – Cf.  Santos, Wanderley dos. Antecedentes Históricos do ABC Paulista 1550-1892.São Bernardo do Campo: PMSBC, 1992. p. 194;   Jornal Correio Paulistano. 8/1/1881. p.1

(7)  - Cf. O Estado de São Paulo, dias 12, 13, e 14 de março de 1898, respectivamente nas páginas 2,3 e 2 do caderno único. 

(8)  - Cf. Jornal Correio Paulistano.  31/1/1892 p.1 , 27/2/1892 p.1. ,  5/4/1892 p.1 ,   6/4/1892. p.1 ; 18/4/1892 p.1. ; 12/5/1892 p1.   Jornal “O Paiz”, 7/4/1892 p.2.; Jornal O Estado de São Paulo, 7/4/1892 p.1

(9) – Cf.  Procuradoria da Câmara Municipal de São Bernardo – Procuradoria. Arrecadação do Imposto Predial do Exercício de 1892  a 1899. p.6 e 7. Acervo: Museu de Santo André Dr. Octaviano Armando Gaiarsa.

 

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