No dia 20 de julho de 1914, o Coronel Saladino Cardoso Franco foi eleito prefeito do antigo município de São Bernardo (1). Tendo permanecido mais de 16 anos no cargo, é até hoje o homem que esteve mais tempo no posto na região, mesmo em comparação com os prefeitos dos municípios surgidos na mesma área após as emancipações, à partir de 1945. Nascido em 1873, descendia de uma antiga família paulista - com ramificações em Jacareí e Mogi das Cruzes- provavelmente assentada no estado desde o século XVII (2). Seu avô, João Cardoso de Siqueira, adquiriu a “Fazenda do Oratório” – que abrangia grande quantidade de terras na capital paulista e no atual município de Santo André- em meados do século XIX. Esta fazenda esteve sob posse dos Cardoso Franco até o final da década de 1920 (3 ). Em 1856, João foi candidato derrotado ao posto de Juiz de Paz da antiga Freguesia de S. Bernardo (4). Já o pai de Saladino, Antonio Cardoso Leite Franco, se candidatou ao mesmo cargo e também ao posto de Subdelegado, nas décadas de 1870 e 1880, tendo obtido apenas a suplência, para as duas funções. Membro da maçonaria em 1896 (5), Saladino iniciou suas atividades públicas, provavelmente, a partir do final da década de 1890, assumindo a subdelegacia do município já no ano de 1900 (6). Ligado ao diretório local do PRP, Saladino foi certamente um figura influente na região mesmo antes de se eleger vereador pela primeira vez, em 1913. Seus irmãos também eram pessoas importantes na Grande São Paulo. Três deles eram professores públicos: José Augusto Leite, Luiz e Lícinio, sendo que os dois primeiros foram autores de diversos artigos sobre pedagogia, publicados do jornal local “O Progresso”, entre 1911 e 1912. Alberto Cardoso Franco, advogado, foi juiz de paz da Freguesia de Santa Efigênia, na capital, enquanto que Olívia Franco era casada com Daniel Amaral, jornalista do “Estado de São Paulo” (7 ). Saladino chegou ao cargo de prefeito pela primeira vez graças à renúncia de Alfredo Fláquer, que à época estava acossado por críticas na imprensa e em litígio com o irmão, o poderoso José Luiz Fláquer (8). Na época, a Câmara Municipal era composta por apenas seis vereadores, eleitos pelo voto direto, os quais escolhiam o prefeito entre si. O mandato, tanto do prefeito, como dos vereadores era de três anos. Constituída por 6 mandatos consecutivos, a “era Saladino” na Prefeitura Municipal de São Bernardo, ficou marcada pelos conflitos com a oposição – primeiro, a família Fláquer reconciliada (9), depois, autonomistas em São Caetano, e finalmente o Partido Democrático, com raízes fortes na sede municipal - pelos esforços em saldar a dívida externa da prefeitura – em grande parte contraída por seu antecessor à empresa francesa Credit Foncier du Bresil, para financiamento da primeira rede de água e esgoto do município - pela identificação oficial do passado histórico do município com a extinta Vila de Santo André da Borda do Campo, consubstanciada na lei n° 251 (18/12/1926), que criava e descrevia o Brasão Municipal, até hoje em uso em São Bernardo do Campo. Apesar de suas diversas cerimônias de posse como vereador e prefeito terem acontecido no prédio da sede Câmara Municipal, no atual n.1325 da Rua Marechal Deodoro, desde o início de seu governo, a maior parte das atividades administrativas aconteciam na sede da Agência da Prefeitura no Distrito de Santo André, em imóvel que foi reformado em sua gestão. O progressivo protagonismo e identificação do município com este que era o local de residência e o distrito natal do prefeito, também foi uma marca de seu tempo à frente da prefeitura, causada, sobretudo, pelos grandes avanços econômicos e demográficos do antigo bairro da estação ferroviária, cuja estrada passou abrigar, em suas margens, diversas grandes indústrias de origem estrangeira, como a francesa Rhodia, da qual Saladino Franco foi acionista e diretor (10). Segundo relatórios publicados pela administração Saladino Franco (11), o número de imóveis urbanos nas duas regiões do município, em 1916, era de 284 na sede (atual centro de S.B.C) e de 657 no distrito de Santo André; em 1927 eram 543 na sede e 1951 em Santo André, o que indica um crescimento de 52% na diferença proporcional entre os números de prédios urbanos das duas localidades. Em relação ao imposto sobre industrias e profissões – que era apenas uma das várias tributações incidentes sobre a atividade industrial - as mesmas fontes apontam que, entre 1921 e 1927, a arrecadação cresceu de 30,3 para 92,3 contos de réis, no Distrito de Santo André, enquanto que na sede, subiu de 17,7 para 30,3 contos de réis, apontando para um aumento de 82 % na diferença proporcional entre as arrecadações das duas localidades. É importante notar ainda o grande crescimento do distrito de São Caetano no período e também, em relação à sede, a significativa expansão das indústrias moveleira e têxtil. Por fim, é interessante destacar que foi durante a “era Saladino Franco” que a epidemia de gripe espanhola chegou ao município. A prefeitura registrou um total de 8790 casos da doença na localidade, entre 18 de outubro e 13 de novembro de 1918, em uma população que seria recenseada - menos de dois anos depois - em cerca de 20 mil habitantes. Em todo município, 135 pessoas faleceram devido a doença – o que aponta para uma taxa de letalidade de 1,54 %. No distrito de Santo André, foi instalado um posto de socorro, com medicamentos – gratuitos em casos de reconhecida indigência - e médicos que eram enviados para todas a localidades de São Bernardo. A prefeitura municipal aplicou todas as orientações da Diretoria Geral do Serviço Sanitário do Estado de São Paulo, tendo proibido eventos esportivos, recreativos e culturais, além de ter obrigado o comércio a fechar as portas às 19 horas (12). Em 28 de outubro de 1930, a Junta Governativa Revolucionária Provisória, órgão das forças militares que extinguiram o governo do presidente Washington Luís, na revolução de 3 de outubro de 1930, destituíram Saladino Cardoso Franco do cargo de prefeito, empossando em seu lugar Armando I. Setti, industrial da sede municipal e líder local do oposicionista Partido Democrático. Dois dias depois Saladino foi levado pelas mesmas forças militares e mantido preso por 28 dias na Hospedaria dos Imigrantes, na capital paulista (13). Saladino Cardoso Franco faleceu a 19 de maio de 1951. Era um dos irmãos da Venerável Ordem Terceira do Carmo, e por isso foi enterrado no antigo cemitério desta congregação (inaugurado em 1868), na capital paulista, junto a seu pai, membro da mesma ordem (14). Imagens: Prefeito Saladino Cardoso Franco. Reprodução do livro “O Estado de São Paulo na comemoração do Centenário” publicado por Roberto Capri, em 1922. 

 

Notas:
(1) – O antigo município de São Bernardo (1890 -1938) englobava toda a atual região do Grande ABC. 
(2) – Conforme os estudos genealógicos do Sr. Artur Rodrigues, disponíveis para consulta no Centro de Memória de S.B.C.
(3) – Cf. Santos, Wanderley dos. Antecedentes Históricos do ABC Paulista: 1550-1892. São Bernardo do Campo, PMSBC, 1992. P. 226.
(4) - Cf. Jornal “Correio Paulistano”, 9/9/1856 p.4. 
(5) – Cf. Boletim do Grande Oriente do Brasil : Jornal Oficial da Maçonaria Brasileira, Publicação Mensal(RJ). p.380.
(6) – Cf. Jornal Correio Paulistano, 14-8-1900, p.1. Já em 1899, uma outra nota na impressa informava que Saladino estava envolvido na execução da ponte sobre o rio grande, na estrada do vergueiro. (Cf. ESP, 24/08/1899, p.1.). 
(7) – Cf. Jornal Correio Paulistano, 28-1-1911, p.3. 
(8) – Cf. Médice, Ademir. Coronel Saladino, prefeito. Raízes. São Caetano do Sul- SP, ano 1, nº 4, p.6, jan 1991.
(9) - Cf. Médice, Ademir . Coronel Saladino, prefeito. Raízes. São Caetano do Sul- SP, ano 1, nº 4, p.7, jan 1991.
(10) - Cf. Jornal Correio Paulistano, 09/04/1947, p.11. 
(11) - Cf. Prefeitura Municipal de São Bernardo. Relatório apresentado à Câmara Municipal de São Bernardo pelo Prefeito Saladino Cardoso Franco. Exercícios de 1916, 1921 e 1927. 
(12) - Cf. . Prefeitura Municipal de São Bernardo. Relatório apresentado à Câmara Municipal de São Bernardo pelo Prefeito Saladino Cardoso Franco. Exercício de 1918.
(13) - Cf. Cf. Médice, Ademir . Coronel Saladino, prefeito. Raízes. São Caetano do Sul- SP, ano 1, nº 4, p.8, jan 1991.
(14) - Cf. Jornal “Correio Paulistano”, 30/01/1890 p.3 e 29/01/1911 p.4; e Jornal “ Estado de São Paulo”, 20/05/1951, p. 4. 

 

Pesquisa e Acervo: Centro de Memória de São Bernardo

Saiba mais sobre sua história em São Bernardo do Campo.

Visite o Centro de Memória de São Bernardo do Campo. Alameda Glória, 197, Centro.

Tel.: 4125-5577. Email:memoria.cultura@saobernardo.sp.gov.br